Esse Cristão Incrível – A. W. Tozer
O esforço feito atualmente por tantos líderes religiosos para
harmonizar o cristianismo com a ciência, a filosofia e tudo que é natural e
razoável, não passa, a meu ver, de uma falha em entender o cristianismo e,
julgando pelo que ouvi e li, falha também em compreender a ciência e a
filosofia. No âmago do sistema cristão encontra-se a cruz de Cristo com o seu
paradoxo divino. O poder do cristianismo se encontra em seu repúdio ao
comportamento dos homens decaídos e não em sua aceitação do mesmo. A verdade da
cruz se revela em suas contra-dições. O testemunho da igreja é mais eficaz
quando declara em lugar de explicar, pois o evangelho é dirigido à fé não à
razão. O que pode ser provado não exige fé para a sua aceitação. A fé repousa
sobre o caráter de Deus e não sobre as demonstrações de laboratório ou lógicas. A cruz se destaca em franca
oposição ao homem natural. Sua filosofia se opõe aos processos da mente
não-regenerada. Foi com essa idéia em foco que Paulo afirmou com toda franqueza
que a cruz é loucura para os que perecem. A tentativa de encontrar um ponto
comum entre a mensagem da cruz e o raciocínio do homem decaído é tentar o
impossível, e se persistirmos o resultado será uma lógica prejudicada, uma cruz
sem significado e um cristianismo despido de poder.
Vamos agora sair da teoria e observar simplesmente o verda¬deiro
discípulo enquanto pratica os ensinamentos de Cristo e de seus apóstolos. Note
as contradições:
O cristão acredita estar morto em Cristo, mas encontra-se mais vivo do
que nunca e espera viver realmente para sempre. Ele anda na terra embora
sentado no céu e apesar de ter nascido neste mundo, depois de sua conversão
descobre que este não é o seu lar. Como o curiango, que no ar é a essência da
graça e formosura mas no chão mostra-se desajeitado e feio, o cristão também se
destaca nos lugares celestiais, mas não se entrosa muito bem na sociedade em
que nasceu. O
cristão logo aprende que, se quiser alcançar vitória como um filho do céu entre
os homens da terra, não deve seguir os padrões adotados comumente pela
humanidade, mas exatamente o sentido oposto. Para salvar-se, corre perigo;
perde a vida a fim de ganhá-la e existe a possibilidade de perdê-la se tentar
conservá-la. Ele desce para subir. Se se recusa a descer é porque já está
embaixo, mas quando começa a descer está subindo.
É mais forte quando está mais fraco e mais fraco quando se sente
forte. Embora pobre tem poder para tornar ricos a outros, mas quando se
enriquece sua capacidade de enriquecer outros se esvai. Ele tem mais quanto
mais dá e tem menos quando possui mais. Ele pode estar, e no geral está, no alto quanto mais
humilde se sente e tem menos pecado quanto mais se torna consciente do pecado.
É mais sábio quando reconhece que nada sabe e tem pouco conhe¬cimento quando
adquire grande cultura. Algumas vezes faz muito quando nada faz e avança rápido
ao manter-se parado. Consegue alegrar-se nas dificuldades e mantém animado o
coração mesmo na tristeza. O
caráter paradoxal do cristão revela-se constantemente. Por exemplo, ele crê que
está salvo agora, mas, não obstante, espera ser salvo mais tarde e aguarda
alegremente a salvação futura. Ele teme a Deus, mas não tem medo dEle. Sente-se
dominado e perdido na presença de Deus, todavia, não há lugar em que tanto
deseje estar como nessa presença. Ele sabe que foi purificado de suas faltas,
mas sente-se penosamente cônscio de que nada de bom habita em sua carne.
Ele ama acima de tudo alguém a quem jamais
viu, e embora seja ele mesmo pobre e miserável, conversa familiarmente com
Aquele que é o Rei de todos os reis e Senhor dos senhores, não percebendo
qualquer incongruência nisso. Sente que de si mesmo é menos que nada,
entretanto crê firmemente ser a menina dos olhos de Deus e que por sua causa o
Filho Eterno se fez carne e morreu na cruz vergonhosa.
O cristão é um
cidadão do céu, mostrando-se leal a essa cida¬dania sagrada. Ele pode, porém,
amar seu país neste mundo com tal intensidade de devoção comparável àquela que
levou John Knox a orar: "Ó Deus, dá-me a Escócia ou morrerei."
Com entusiasmo aguarda entrar naquele mundo
brilhante lá de cima, mas não tem pressa de deixar esta terra e mostra-se
perfeita¬mente disposto a esperar o chamado de seu Pai Celestial. Sente-se
também incapaz de compreender por que o incrédulo deva conde¬ná-lo por isso;
tudo lhe parece tão natural e correto dentro das circunstâncias que não vê
qualquer inconsistência nisso. O
cristão que leva a cruz é, além de tudo, um pessimista confirmado e um otimista
que não pode ser igualado por ninguém mais neste mundo. Quando olha para a cruz é um pessimista, pois sabe
que o mesmo juízo que caiu sobre o Senhor da glória condena nesse ato único
toda a natureza e todo o mundo dos homens. Ele rejeita qualquer esperança
humana fora de Cristo pois sabe que o mais nobre esforço do homem não passa de
pó edificado sobre pó. Todavia,
o seu otimismo é calmo e repousante. Se a cruz condena o mundo, a ressurreição
de Cristo garante o triunfo final do bem em todo o universo. Através de Cristo
tudo acabará bem e o cristão aguarda a consumação. Cristão incrível!
Fonte: Livro: O melhor de A. W. Tozer
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